Escavações em Itaboraí podem revelar fóssil humano de 2 milhões de anos
A busca por um fóssil humano de 2 milhões de anos, que poderá mudar a história da ocupação das Américas, começou este mês em Itaboraí. A responsável pela expedição é a arqueóloga Maria Beltrão, reconhecida como uma das mais importantes do país, e que fez parte do grupo que encontrou, nos anos 70, em Lagoa Santa (MG), o crânio considerado, até hoje, como o mais antigo do Brasil.
Junto com sua equipe, ela trabalha no Parque Paleontológico de São José, mantido pela Prefeitura. As escavações estão em fase inicial e não têm prazo para terminar.
“Estamos iniciando um trabalho que será muito difícil, devido ao tamanho do local. Esse sítio em Itaboraí, na minha opinião, é um dos mais importantes do mundo, e tem um grande potencial científico”, diz a arqueóloga.
Aos 80 anos de idade, Maria Beltrão costuma ir três vezes por semana ao acampamento em Itaboraí. O tamanho da área a ser escavada é de 1.500 m². Nas primeiras ações já foram encontrados artefatos que dão indícios da presença humana em períodos remotos. O que faz Maria Beltrão acreditar na possibilidade de que este fóssil esteja enterrado em Itaboraí é, justamente, o fato de já terem sido encontrados por ela na região – também nos anos 1970 – objetos feitos por mãos humanas muito semelhantes a outros existentes na África, e que datam de 2 milhões de anos.
“Na década de 1970, numa pequena escavação de 12 metros, encontrei no Parque de São José artefatos correspondentes a todos os homens fósseis existentes na África”, afirma Maria Beltrão. “Isso é uma coisa extraordinária”.
A respeito do Parque Paleontológico de São José, Maria Beltrão diz ainda não conhecer outro sítio como o de Itaboraí, onde há registros de artefatos e animais de praticamente todas as eras nas quais o homem habitou a Terra.
“Na África, também temos artefatos de diversas épocas da história da Humanidade, mas eles encontram-se espalhados por sítios diversos. Itaboraí é o único local no mundo, dos quais eu tenho conhecimento, onde artefatos de todas as épocas podem ser encontrados no mesmo sítio”, explica a cientista.
Até hoje, acredita-se que o homem tenha chegado às Américas há cerca de 30 mil anos. O fóssil humano mais antigo do Brasil tem 11.800 anos e, conforme citado, foi encontrado pela própria Maria Beltrão, numa expedição chefiada pela arqueóloga francesa Annette Laming-Emperaire, nos anos 70, em Lagoa Santa (MG).
O Parque Paleontológico de São José
Em 1928, um fazendeiro achou pedaços de rocha que considerou interessantes. Levou para análise e descobriu que se tratava de calcário. Com isso, a área foi vendida para a Companhia Nacional de Cimento Mauá, cuja produção foi aproveitada na construção da Ponte Presidente Costa e Silva (Rio-Niterói) e do Estádio Mário Filho (Maracanã). A fábrica foi visitada por grandes personalidades, incluindo alguns presidentes da república, sendo considerada uma das experiências mais bem-sucedidas de fabricação de cimento no país.
Com a exploração mineral, descobriram-se vestígios arqueológicos. E quando o calcário terminou, em 1984, restou uma depressão de 70 metros, que foi progressivamente coberta com água da chuva e de veios subterrâneos, erguendo um lago artificial. Seis anos depois, em 1990, a Prefeitura Municipal de Itaboraí declarou a área de utilidade pública, através de um processo de desapropriação. Com isto, em 1995, nascia o Parque Paleontológico de São José, eleito pela Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos (Sigep), órgão ligado à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), um dos patrimônios da humanidade.
No Parque já foram descobertos fósseis de diversos mamíferos, gastrópodes, répteis e anfíbios, se destacando o tatu mais antigo do mundo e o ancestral das emas – ambos do Paleoceno, datados de cerca de 55 milhões de anos. Foram achados, também, fósseis de preguiça gigante e mastodonte, da Idade Pleistocênica (aproximadamente 20 mil anos). Também foram encontrados restos arqueológicos, evidenciando a presença do homem pré-histórico no local.
Localizado na Região Metropolitana do Rio, distante cerca de 60 km da capital fluminense, o Parque compreende uma área de cerca de 100 mil metros quadrados, na Bacia de São José. Recentemente, a Prefeitura iniciou um trabalho para fazer da área um ponto não apenas de pesquisa mas também de turismo científico. O primeiro passo foi convidar a arqueóloga Maria Beltrão para assumir a direção da unidade. A Prefeitura tem feito uma série de melhorias no Parque, e busca recursos junto às esferas estadual e federal, e também junto à iniciativa privada, para investimentos de grande porte no local, que hoje encontra-se aberto à visitação.
Modernização e visitação
A Prefeitura de Itaboraí tem feito uma série de melhorias no Parque Paleontológico. Para viabilizar as escavações realizadas atualmente pela equipe de Maria Beltrão, foi construía uma estrada de cerca de 2 km de extensão, que leva até o morro da Dinamite, local da pesquisa. Em 2014, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo inaugurou uma série de equipamentos no Parque. O local ganhou uma sala de vídeo 3D, nova sinalização e aparelhos para serem utilizados nos laboratórios científicos. Os investimentos resultam de uma parceria com a Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).
Quem quiser conhecer o parque pode entrar em contato com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo para agendar uma visita guiada gratuita ao local. O agendamento pode ser feito de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, pelo telefone (21) 3639-1908 ou através do email parque.paleontologico@itaborai.rj.gov.br.