Niterói amplia licença-paternidade e debate sobre benefício reacende

415 dias. Essa é a principal diferença entre ser pai na Suécia e no Brasil em termos de licença-paternidade.

Enquanto os pais suecos podem ficar até 420 dias longe do trabalho para cuidar do filho, um pai brasileiro tem direito a cinco dias corridos de licença.

Algumas cidades brasileiras, no entanto, vêm dando os primeiros passos para reduzir essa diferença.

A mais recente foi Niterói, no Rio de Janeiro, onde a câmara municipal aprovou um projeto ampliando para 30 dias a licença-paternidade dos funcionário públicos.

Publicada no Diário Oficial, a medida já está em vigor, para a alegria de servidores com mulheres grávidas – e para o desespero do prefeito.

“É uma demanda justa a luta pela divisão de tarefas na hora de criar os filhos. Precisamos de uma sociedade livre de sexismo”, disse à BBC Brasil o autor do projeto, o vereador de Niterói Henrique Vieira (PSOL), citando exemplos de servidores que já estão utilizando o benefício.

‘Desnecessário’

Mas na outra ponta da mesa está o prefeito Rodrigo Neves (PT), que em entrevista ao jornal O Globo disse “não parecer necessário, nem fundamental” uma licença-paternidade de um mês.

“Como vamos lidar com a falta de professores, garis, profissionais da conservação, com uma ausência por tanto tempo? Na condição em que assumimos a prefeitura, isso é impossível”, disse o prefeito ao jornal carioca, anunciando que iria tentar derrubar a medida.

Para o vereador autor do projeto, que é uma emenda à Lei Orgânica do município, o argumento do prefeito é “risível”.

“Ele acha o quê? Que 300 funcionários vão sair de licença ao mesmo tempo? Será que há mesmo o risco de um posto de saúde ou uma escola ficar totalmente sem funcionários? Quais as chances de todos os professores ou todos os médicos saírem de licença ao mesmo tempo?”, questiona Vieira.

“Não dá para subtrair direitos do cidadão com essa desculpa de que a medida trará prejuízos ou prejudicará o funcionamento da cidade.”

No entanto, entidades como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) já se mostraram contrárias à ampliação.

“Nós valorizamos um contato maior do pai com o filho, mas qualquer ampliação da licença-paternidade causaria um aumento no custo de produção para a empresa e, consequentemente, impactaria no mercado consumidor”, afirma Sylvia Lorena de Sousa, gerente Executiva de Relações do Trabalho da CNI.

Segundo Sylvia, a CNI não fez um levantamento do quanto custaria às indústrias conceder uma licença de mais de 5 dias aos pais.

“Para nós, qualquer prazo maior (de licença) não deve ser feito por meio de uma lei, que engessa. E sim por meio de negociação entre as partes: empresa e sindicato ou empresa e funcionário. Assim, se permite que as partes se ajustem de acordo com suas necessidades.”

Benefício social

A história, no entanto, é diferente em outra prefeitura no Estado do Rio, Macaé, onde a licença-paternidade é de 30 dias há mais de dez anos.

“Acompanho o orçamento da Prefeitura de Macaé há muito tempo e garanto: a licença de um mês para os pais não causa prejuízo. Isso porque o gestor sabe com antecedência que o funcionário ficará fora e assim adapta seu setor, como acontece com uma grávida”, explica Aderson Ferreira, secretário de Administração municipal de Macaé.

Para ele, o retorno desse benefício é altamente positivo, já que um mês depois, o funcionário teve tempo de se adaptar à sua nova rotina e volta mais mais focado e produtivo. “Muito mais do que se voltasse apenas alguns dias depois do nascimento do filho, com a mente na casa dele, superpreocupado com o bebê e com a mãe.”

A ideia de que é crucial se levar em conta o benefício social de uma licença mais longa é compartilhada também por ativistas pelo direito das famílias.

“A ampliação da licença-maternidade para seis meses trouxe um benefício muito grande para as mães, mas também um prejuízo, ao reforçar que só a mulher – e apenas ela – é responsável por cuidar da criança, enquanto o homem é responsável por sustentar financeiramente a família”, diz Sirley Vieira, coordenador-executivo do Instituto Papai, uma ONG de Recife que defende a igualdade de direitos entre homens e mulheres.

“Isso reforça o papel de que o cuidado da criança é apenas da mulher e, na prática, toma um significado de que mesmo depois que ela volta a trabalhar, a responsabilidade segue sendo dela.”

Segundo o cordenador da ONG, a chamada licença parental – em que pai e mãe dividem total ou parcialmente os meses de licença, se revezando em quem fica em casa e quem volta ao trabalho – seria um cenário melhor para a mulher, para o homem e para o bebê.

“A criança ganha com o pai mais presente e aprende que a responsabilidade da criação dos filhos é dos dois, do pai e da mãe. E, em última instância, isso ajuda a não reproduzir esse pensamento machista de que a criação dos filhos é responsabilidade da mãe.”

Batalha

Enquanto em Niterói a disputa sobre se a licença de um mês permanece, a ideia ganha fôlego fora do município.

No Rio de Janeiro, o vereador Renato Cinco (PSOL) já apresentou um projeto semelhante para ampliar o benefício. “Ainda estamos na primeira fase do processo, que já foi protocolado e agora vai começar a tramitar. Sei que vamos enfrentar alguma resistência, mas estou otimista.”

Já em nível nacional, talvez seja necessário um maior grau de otimismo. O projeto de lei que prevê a licença-paternidade de um mês, de autoria da deputada Erika Kokay (PT), tramita desde 2011.

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