Manifestantes contra o governo são brancos e de alta renda, aponta pesquisa
Os cidadãos e cidadãs que participaram das manifestações do último domingo (16) são, em sua maioria, brancos, de alta renda, têm alta escolaridade e votaram no candidato Aécio Neves nas últimas eleições presidenciais. É o que demonstram pesquisas feitas durante as manifestações na Avenida Paulista, em São Paulo, pelo Instituto de Pesquisa Datafolha, e na praça da Liberdade, em Belo Horizonte, pelo Grupo Opinião Pública, sediado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e que reúne pesquisadores de 20 instituições de ensino superior com o apoio do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas. Os levantamentos mostram um perfil semelhante nas duas capitais.
Segundo o Instituto Datafolha, os resultados mostram um perfil diverso ao do paulistano médio. Na população da cidade com 16 anos ou mais, 48% se declaram brancos, 28% chegaram ao ensino superior e 69% têm renda familiar de até cinco salários mínimos.
Em Belo Horizonte, 56,6% disseram ter renda familiar mensal superior a cinco salários mínimos, 64,5% têm pós-graduação, ensino superior completo ou em curso, e 58,8% se declararam brancos. No que diz repeito à posição político-ideológica dos paulistas,14% disseram ser de esquerda, 34% alegam estar no centro e 47% ser de direita. Em São Paulo, 77% declararam ter votado em Aécio no segundo turno da eleição de 2014. Em Belo Horizonte, 79%.
Para a pesquisadora Helcimara Telles, da UFMG, apesar de as manifestações serem compostas majoritariamente por pessoas que votaram em Aécio Neves, os atos não são pró-PSDB e sim “profundamente anti-petistas.” A pesquisa de Belo Horizonte avaliou a presença de eleitores do PT nas manifestações e mostrou que 53,7% dos presentes já votaram no PT alguma vez. Quanto aos sentimentos em relação ao partido, 75,6% disseram ter raiva e 72,1% sentem aversão. Os sentimentos em relação à presidenta Dilma Rousseff são parecidos: 75,6% sentem raiva e 70,7%, aversão.
Helcimara Telles defende que o perfil ideológico dos manifestantes é conservador e de direita.
Na opinião do cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), que acompanhou as manifestações na capital do país, “a única coisa que une todas essas pessoas é a aversão, decepção e chateação pela situação, especialmente a crise econômica”, disse. “Tem diferentes grupos, os que defendem impeachment, intervenção militar e até monarquistas e parlamentaristas, mas o que une todos é a crise econômica e política.” Ele também destacou que ,“dessa vez, foi um pouco diferente porque houve muita crítica ao ex-presidente Lula e muito louvor e elogios ao juiz Sérgio Moro.”
Em Belo Horizonte, diante da pergunta “Nesse momento, o que você acha que seria melhor para o país?”, 40,8% citaram o impeachment da presidenta Dilma, 36,4% a renúncia da presidenta e 13,1% a intervenção militar.
Helcimara avalia que boa parte dos manifestantes são democratas ambivalentes, para quem a democracia é aceitável desde que uma certa ordem seja mantida. “Aceitam a democracia, mas em certas condições e contextos, podem aceitar governos autoritários, ou seja, podem ser uma massa de pessoas que pode ser atraída, no futuro, por candidatos neopopulistas, candidatos que se coloquem acima das estruturas político-partidárias”.
Quando perguntados se “em situação de muita desordem, os militares devem ser chamados a tomar o poder”, 46,8% dos entrevistados disseram que “concordam totalmente/em parte”, 47,2% “discordam totalmente/em parte” e 5,8% “nem concordam/nem discordam”.
Para Helcimara, essa é uma posição antidemocrática. “A própria palavra desordem é muito subjetiva, Hoje, por exemplo, no momento de uma crise política, essa crise pode ser confundida com desordem.”
Participação
Para o cientista político David Fleischer, o ato de domingo foi um pouco maior do que o de abril, mas menor que o de março. Ele avalia que uma das peculiaridades do último protesto foi que o PSDB se encarregou de divulgar o evento e vários tucanos estiveram presentes. “E o governo usou isso para mostrar que, apesar ou por causa dessa divulgação, as manifestações foram menores que o esperado.”
O cientista político Márcio Malta, do Rio de Janeiro, acredita que o público menor no domingo na manifestação da Avenida Atlântica, em Copacabana, e em outras capitais, traz certa tranquilidade para o governo, que temia participações mais maciças do que nos atos de março e abril. “Era um grande medo que essas manifestações crescessem. Há um cenário de um pouco mais de tranquilidade para o governo tentar articular e movimentar os setores que o têm apoiado.”
Para Malta, o movimento arrefeceu como resultado da mudança de postura do governo. “Desde a semana passada, o governo soube, de forma hábil, tecer acordos no Senado, com setores do grande empresariado brasileiro, assim como alguns conglomerados dos meios de comunicação.”